CRISPR-Cas9 na terapia gênica de carcinoma papilífero de tireoide e limites éticos nas modificações da espécie
CRISPR-Cas9 in the gene therapy of papillary thyroid carcinoma and ethical limits in species modifications
Keyla Liebel1, Jufner Vaz Toni2, Kely Braga Imamura3
1 UNYLEYA, Genética de microrganismos – Brasília, DF, Brasil.
2 UNYLEYA, Oncologia Farmacêutica – Brasília, DF, Brasil.
3 UNYLEYA, Oncologia Farmacêutica; UNYLEYA, Genética de microrganismos – Brasília, DF, Brasil.
Recebido em 23/02/2022
Aprovado em 02/05/2022
DOI: 10.21877/2448-3877.202200026
INTRODUÇÃO
Na década de 1980, cientistas observaram um padrão estranho em alguns genomas bacterianos, em que uma sequência de DNA poderia ser repetida diversas vezes, com sequências únicas entre as repetições. Eles chamaram essa configuração estranha de “agrupados de curtas repetições palindrômicas regularmente interespaçadas”, ou CRISPR. Todavia, as possibilidades de utilização do sistema CRISPR só foram entendidas mais tarde, em 2012, quando Emmanuelle Charpentier(1) descobriu uma molécula chamada tracrRNA enquanto estudava a bactéria Streptococcus pyogenes, responsável por causar faringite. Estas sequências únicas entre as repetições combinavam com o DNA de vírus, especificamente de vírus de bactérias.(2) O locus do sistema CRISPR compreende curtas repetições diretas e separadas por sequências de DNA variáveis (fragmentos de DNA do organismo invasor), chamadas de “espaçadores”, flanqueadas por diversos genes cas.
Ao entrarem na célula hospedeira, moléculas de DNA exógeno ativam o sistema de defesa bacteriano por meio da produção de enzimas (Cas1 e Cas2) que cortam o DNA estranho em pequenos fragmentos de aproximadamente 20 nucleotídeos.(2,3) Existem várias enzimas Cas, porém a mais utilizada é a Cas9 (nuclease), formando o sistema CRISPR-Cas tipo II, originalmente encontrado na bactéria S. pyogenes. A enzima Cas9 é responsável por cortar as duas fitas da dupla hélice do DNA, abrindo o espaço para a inserção de um novo trecho,(3) assim, o sistema CRISPR-Cas tem a finalidade de proteger a bactéria contra os elementos genéticos móveis,(4) sequências específicas de DNA exógeno(5,6) e, em alguns casos, RNA.(7)
A Norte-americana Jennifer Doudna já tinha estudado proteínas Cas9, porém sem resultados. O que faltava em sua pesquisa era a molécula tracrRNA que Emmanuelle descobrira para intermediar o CRISPR e a enzima Cas9. Charpentier e Doudna perceberam, então, que a “tesoura” criada em laboratório poderia cortar o DNA de qualquer espécie, além de poder escolher o trecho de DNA que se pretende cortar. Dessa forma, quando o alvo é identificado, a enzima Cas9 corta a dupla hélice em duas partes, impedindo a replicação de um vírus ou, no caso da técnica de edição, alterando a sequência de um genoma.(8)
Para tanto, o sistema CRISPR, que utiliza, além da nuclease Cas9, o gRNA (RNA guia, fusão de crRNA e tracrRNA), contendo 20 nucleotídeos na extremidade 5’ e uma sequência PAM de identificação para a Cas9 clivar,(6) foi adaptado com o intuito de induzir a dupla quebra do DNA em locais específicos, seguido da edição do genoma segmentado, permitindo a geração de diversos modelos transgênicos e expandindo a engenharia genética com a possibilidade de novos modelos de estudo.(9) É possível utilizar a técnica CRISPR-Cas9 no melhoramento genético de plantas com o intuito de se promover resistência às pragas, bem como aos períodos secos. A ideia é permear a técnica e utilizá-la em terapias para o câncer e doenças hereditárias. O mais interessante do sistema é a possibilidade de substituir trechos de DNA por outros, remover partes do genoma que contém genes predispostos a alguma doença, substituindo esta parte por trechos genéticos onde não há essas mutações.(10)
O câncer de tireoide é um dos tumores mais comuns que afetam a região do pescoço e cabeça. Na maioria dos casos, o tratamento costuma ser simples e ter alta taxa de remissão com a radioterapia, no entanto as variantes agressivas desse câncer são mais difíceis de tratar e nem sempre respondem bem ao tratamento. Dessa forma, a possibilidade de utilizar a técnica CRISPR-Cas9 no tratamento de tumores traz uma nova perspectiva para a área.(11) No meio de todo esse dilema estilo “ovo ou galinha”, o que se questiona é continuar as pesquisas para entender os riscos e determinar um limite, ou determinar um limite para continuar as pesquisas sem riscos.(12) Alinhar os preceitos éticos é um dever com a humanidade, ao passo que avançar nas pesquisas de cura ao câncer é uma possibilidade real ao utilizar o sistema CRISPR-Cas9. Dessa forma, o objetivo deste estudo é identificar os benefícios da técnica CRISPR-Cas9 no tratamento de câncer, especificamente de carcinoma papilífero de tireoide, expondo os limites éticos nas modificações da espécie humana.
MATERIAL E MÉTODOS
Trata-se de um estudo descritivo e analítico utilizando uma base de dados secundária. Foram realizadas pesquisas nos bancos de dados SciELO e PubMed, utilizando os descritores, em português/inglês, “CRISPR”, “CRISPR-Cas9”, “carcinoma papilífero de tireoide/CRISPR-Cas9”, no período de 01/01/2015 – 31/12/21. Foram incluídos no estudo os artigos que utilizam o sistema CRISPR-Cas9 no tratamento de câncer, especificamente de carcinoma papilífero de tireoide, e discussões sobre os limites éticos nas modificações da espécie humana. Foram excluídos os relatos de caso e pesquisas experimentais.
REVISÃO DA LITERATURA
Histórico do CRISPR-Cas9
O pesquisador Yoshizumi Ishino e sua equipe da Universidade de Osaka (Japão) identificaram uma região peculiar no genoma da bactéria Escherichia coli, constituído por uma configuração incomum: sequências repetidas e sequências espaçadoras intercaladas de função desconhecida. Tais sequências foram investigadas independentemente em 1993, e em 2000 elas foram identificadas nos genomas de diferentes bactérias. Porém, ainda segundo Jansen,(13) somente em 2002 a sigla CRISPR (Clustered Regularly Interspaced Short Palindromic Repeats ou Repetições Palindrômicas Curtas Agrupadas e Regularmente Interespaçadas) foi criada para denominar estas sequências. Bactérias e vírus sempre travaram uma batalha ao longo da evolução das espécies. Alguns bacteriófagos são capazes de lisar as células bacterianas, todavia algumas bactérias possuem um mecanismo de defesa capaz de proteger o seu material genético da invasão dos vírus, criando uma verificação de “memória”,(14) utilizada na próxima vez que a célula for invadida pelo vírus.
Em 2012, Emmanuelle Charpentier(1) notou, ao descrever a bactéria S. pyogenes, que era muito simples cortar e alterar uma região precisa no genoma de escolha, onde os componentes pudessem ser controlados. Em conjunto com a pesquisadora Jennifer Doudna, Charpentier encontrou moléculas de RNA remanescentes do material genético viral, revelando que acopladas às formas mais longas do CRISPR estavam as nucleases Cas9. Esta descoberta da edição genômica por CRISPR-Cas9 concedeu o prêmio Nobel para as pesquisadoras. CRISPR(15) e a proteína Cas9 formam uma “tesoura” capaz de reconhecer e cortar uma porção específica do DNA viral, nesse sentido, é possível direcionar a “tesoura” para um ponto desejado do genoma, permitindo a inativação e modificação dos genes, inserindo alterações desejadas e específicas guiadas pelo RNA guia.(16)
Função biológica do CRISPR-Cas9
O sistema CRISPR-Cas tem a finalidade de proteger a bactéria contra os elementos genéticos móveis, sequências específicas de DNA exógeno e, em alguns casos, RNA.(4,5,7) É basicamente um sistema de defesa bacteriano.
De acordo com Lessa,(17) a região CRISPR é uma parte do material genético das bactérias que possui repetições “intercaladas” por pequenos pedaços de DNA de vírus que as infectaram no passado e, dessa forma, quando um vírus, com uma sequência de DNA existente nessa região invade a célula bacteriana, o mecanismo de defesa da bactéria envia a Cas9, uma nuclease, capaz de cortar a dupla fita do DNA viral na região em que há essa compatibilidade, ativando o sistema de “memória genética”.
Todavia, para que a Cas9 consiga identificar essa parte do material genético do vírus, a célula codifica um RNA guia a partir da sequência do DNA viral contido na região CRISPR.
De acordo com Arend, Pereira e Markoski,(18) o sistema CRISPR-Cas9 pode ser utilizado para reparar mutações na região, como por exemplo para introduzir novas mutações, por meio do nocaute gênico, editando o genoma. A técnica é capaz de auxiliar também nos rearranjos cromossômicos, na regulação da expressão gênica, na busca de novos alvos para proteínas de ligação relacionadas com o reparo do DNA.(19)
Etapas do CRISPR-Cas9
Foram descritos três tipos distintos de sistema CRISPR-Cas, os tipos I, II e III, e onze subtipos. Nove proteínas Cas fazem parte do sistema: Cas1 e Cas2 estão presentes nos três tipos; Cas5, Cas6 e Cas7 nos tipos I e III. As proteínas exclusivas de cada sistema são Cas3 e Cas8 no tipo I, Cas9 no tipo II e Cas10 no tipo III.(20) O tipo II é o sistema mais simples de todos, e conta com a endonucleasse Cas9, guiada pelo crRNA. Durante uma infecção, o complexo formado pela Cas9 cliva o genoma viral, baseando-se no domínio PAM. A enzima Cas9 comporta dois domínios com atividades nucleásicas (RuvC e HNH), que participam da imunidade. O sistema CRISPR-Cas tipo III é o mais complexo, subdivididos em dois subtipos, III-A e III-B, que estão associados à proteína Cas10, podendo ser diferenciados pelos genes acessórios csm no subtipo III-A e cmr no III-B, requerendo domínios PAM para o reconhecimento da sequência alvo ou para a clivagem. O tipo III reconhece e cliva o RNA ou o DNA com material genético exógeno. O tipo III-A degrada o DNA invasor e o tipo III-B degrada apenas o RNA invasor.(10)
É importante ressaltar que a sequência PAM está presente apenas na sequência do alvo, ou seja, o CRISPR loci não contém a sequência PAM e dessa forma este não será cortado pela Cas9, apenas o DNA alvo conterá a sequência PAM e, portanto, somente ele será clivado pela Cas9.(21) O processo de “imunidade” de CRISPR-Cas envolve três mecanismos diferentes: (i) adaptação, (ii) expressão (biogênese do crRNA) e as (iii) interferências (ação contra o invasor).(22,23,24)
O estágio de adaptação envolve a incorporação de fragmentos de DNA exógenos, conhecidos como PAM (protospacers adjacent motif – motivo adjacente ao protoespaçador) de vírus e plasmídeos que invadiram a célula, sendo incorporados dentro do arranjo CRISPR (na sequência líder) como novos espaços, utilizando as proteínas Cas1 e Cas2, presentes no genoma que possui o sistema CRISPR. Estes espaços geram sequências de memória para uma defesa específica contra subsequentes invasões pelo mesmo vírus ou plasmídeo.
Todavia, após o corte, o DNA tenta se regenerar, sofrendo alterações em sua sequência e, assim, o gene pode ser “desativado” no processo.(12)
Durante o estágio de expressão, o arranjo CRISPR é transcrito, pela RNA polimerase, como um precursor transcricional (pre-crRNA), processado e amadurecido para produzir CRISPR RNAs (crRNAs). Nesta fase, ocorre a transcrição ininterrupta do locus CRISPR, mediada pela sequência líder, que é uma região que possui muitas adeninas-timinas servindo como região promotora.(25)
Já na etapa de interferência, crRNAs auxiliados por proteínas Cas formam complexos que funcionam como guias para alvos específicos, reconhecendo e clivando o ácido nucleico do respectivo vírus ou plasmídeo.(24,26)
Basicamente, cada crRNA formará um complexo com um segundo RNA chamado de RNA-trans-ativação crRNA (tracrRNA), uma região conservada da bactéria. A fusão destes dois RNAs (crRNA e tracrRNA) formará o RNA guia (gRNA). O gRNA possui uma sequência contendo cerca de 20 pb (utilizada para a ligação no DNA alvo).(27,21)
Para a Cas9 se ligar com sucesso ao DNA, a sequência-alvo no DNA genômico precisa ser complementar à sequência do gRNA e deve ser seguida pela sequência correta PAM.
CRISPR-Cas9 no tratamento gênico de câncer
O sistema CRISPR-Cas9 apresenta um grande potencial para ser usado como sistema no tratamento de várias doenças de causa genética, incluindo o câncer, as doenças monogênicas, e as doenças infecciosas, como a hepatite B e o HIV.(28)
O sistema na edição, bem como na remoção de mutações específicas nos oncogenes ou proto-oncogenes, responsáveis pela multiplicação descontrolada na célula, que resulta nos tumores, tem sido aplicado. Esta ferramenta pode ser aplicada em humanos, cujas células são coletadas, modificadas em laboratório e reintroduzidas.
Basicamente, a técnica funciona da seguinte forma: LNPs (nanopartículas lipídicas) visam especificamente as células cancerosas e as destroem por meio da manipulação genética.
O sistema CRISPR-LNPs carrega um RNA mensageiro que codifica para a enzima CRISPR-Cas9, atuando como uma tesoura molecular, cortando o DNA das células. Vale ressaltar que o método CRISPR-Cas9 também pode ser utilizado no combate a cânceres metastáticos, por meio da utilização de nanopartículas lipídicas, o que pode ser um passo importante na direção da cura desta doença agressiva.(29)
CRISPR-Cas9 no tratamento de carcinoma papilífero de tireoide
A tireoide é uma glândula do sistema endócrino responsável pela produção de hormônios que agem no controle de diversos órgãos do corpo humano.
O indivíduo apresenta a condição clínica chamada de bócio quando a glândula apresenta um crescimento anormal, causando desequilíbrio em alguns hormônios.
O carcinoma medular de tireoide (CMT) é uma neoplasia das células C ou parafoliculares da tireoide, correspondendo a 5% a 8% dos tumores malignos da glândula. O CMT apresenta-se como um tumor esporádico ou hereditário. Quando hereditário, é um dos componentes de uma síndrome genética de herança autossômica dominante, apresentando-se isoladamente na forma de carcinoma medular de tireoide familiar ou como um dos componentes das síndromes de neoplasia endócrina múltipla. O proto-oncogene RET é o responsável pela forma hereditária da neoplasia. Testes moleculares disponíveis formam a base para o manejo adequado da hereditariedade do tumor, pois o diagnóstico e, consequentemente, o tratamento precoce melhoram significativamente o prognóstico no indivíduo afetado e nos carreadores assintomáticos.(30)
O CMT apesenta como principais sintomas, além do aumento progressivo do nódulo no pescoço, a rouquidão, a sensação de falta de ar e a dificuldade em engolir alimentos. Os fatores de risco para tais anomalias envolvem histórico de irradiação, como a radioterapia de cabeça e pescoço, histórico familiar e associação com dietas pobres em iodo.(31) Segundo o INCA (2021),(32) o câncer de tireoide é um dos tumores mais comuns que afetam as regiões de pescoço e cabeça.
Na maioria dos casos, o tratamento costuma ser simples, envolvendo procedimentos cirúrgicos como a retirada total ou parcial da tireoide. Nas formas mais agressivas há complementação terapêutica com iodo radioativo, porém as variantes agressivas desse câncer são mais difíceis de tratar e podem não responder bem ao tratamento. Isso ocorre, em parte, porque um microRNA, que são pequenos RNAs endógenos que regulam a expressão gênica pós-transcricional do miR-17–92, tem sua expressão aumentada em tumores desenvolvidos nas glândulas.
Dessa forma, o objetivo de melhorar o tratamento do câncer consiste em inibir a expressão do miR-17-92. A edição do miR-17-92 é um desafio, pois o microRNA é um cluster (genes não codificantes) composto por seis microRNAs diferentes, entretanto é possível fazer a edição gênica desse microRNA utilizando a técnica CRISPR-Cas9, alterando a sequência de nucleotídeos do gene. Alguns pesquisadores já testaram a técnica em células do carcinoma de tireoide.(11,31)
Existem algumas formas de utilizar a técnica CRISPR-Cas9 no combate ao câncer de tireoide. A edição gênica pode ser usada como neoadjuvante no tratamento já existente de cânceres agressivos, como a terapia de inibidores farmacológicos. Pesquisadores estudaram a capacidade de algumas células diferenciadas em expressar genes relacionados ao metabolismo do iodo, uma vez que o principal tratamento para o câncer de tireoide é o iodo radioativo. Alguns genes como o TPO e o NIS, responsáveis pela captação de iodo, aumentaram a sua diferenciação, mas não o suficiente para que a capacidade de iodo fosse regenerada,(11) porém com a utilização da técnica CRISPR-Cas9 seria possível regenerar essa capacidade.
Nos carcinomas de tireoide, há também a mutação no gene BRAF, comum em 40% desses carcinomas. Essa mutação possui efeitos sobre a expressão de miR-17-92, que é um potente regulador da diferenciação de células foliculares da tireoide. A utilização de inibidores combinados com a edição de microRNA, por meio do sistema CRISPR-Cas9, seria responsável por bloquear a expressão do miR-17–92, melhorando a diferenciação dos genes da tireoide e diminuindo a expressão do gene NIS no câncer agressivo da tireoide.(33)
CRISPR e limites éticos
Se no passado, para saber a respeito do futuro, os indivíduos consultavam os astros, na atualidade, a consulta aos genes tem sido a aposta para prever o futuro, na esperança de decifrar totalmente o ser humano. Nesse sentido, a humanidade começa a ter em suas mãos ferramentas e conhecimentos no âmbito da genética e da aplicação da engenharia genética que prometem revolucionar completamente a sua vida, bem como a fauna e a flora das regiões.
Neste sentido, é necessário ter limites e conhecimentos éticos para não condenar precocemente uma descoberta científica que pode trazer muitos benefícios à humanidade, embora tal descoberta não esteja isenta de comprometer a vida do ser humano no futuro,(34) visto que a habilidade de modificar pontos no genoma humano é objetivo da medicina desde o conhecimento do DNA como unidade básica da hereditariedade.
Uma das dificuldades do sistema CRISPR-Cas9 é a utilização de vetores virais como veículo, pois esses vetores possuem a capacidade de infectar várias células, todavia a técnica já utiliza como alternativas os plasmídeos e alguns métodos físicos, como a eletroporação, diminuindo as variáveis do sistema.(35) A era da edição do genoma levanta questões éticas que precisarão ser abordadas por cientistas e pela sociedade em geral.
O quanto podemos usar esta ferramenta poderosa de forma a garantir o máximo benefício ao mesmo tempo em que minimiza os riscos? Será importante que entendamos os fundamentos desta tecnologia para facilitar o discurso público racional. Os laboratórios também precisarão considerar a melhor forma de promover o uso responsável da tecnologia CRISPR-Cas9 sem inibir a pesquisa apropriada e o desenvolvimento da técnica.(15)
CONCLUSÃO
No final do século XX, intensificaram-se as discussões em torno de questões éticas sobre a manipulação genética em humanos. Esta discussão permanece no século XXI, essencialmente após a descoberta do sistema CRISPR-Cas9, uma técnica de edição do DNA que pretende facilitar a engenharia genética. Essa técnica pode ser utilizada no tratamento das doenças genéticas e diversos tumores, como o câncer de tireoide. No entanto, um dos maiores desafios científicos é desenvolver metodologias para que a técnica de CRISPR-Cas9 não modifique o genoma humano em locais não intencionais e não programados, o que traria consequências imprevisíveis para os pacientes, seus descendentes e, em um aspecto mais amplo, para toda a espécie humana e seu ecossistema.
REFERÊNCIAS
- Charpentier’s E. Experiment About the CRISPR/Cas 9 System’s Role in Adaptive Bacterial Immunity (2012)”. Embryo Project Encyclopedia (2017-10-19). ISSN: 1940-5030.
- Burmistrz M, Pyrc K. CRISPR-Cas systems in prokaryotes. Polish J. Microbiol, Warsaw, 2015; (64):193-202.
- Bondy-Denomy J, et al. Prophages mediate defense against phage infection through diverse mechanisms. ISME J, Wageningen, 2016; 10(12):2854-2866.
- Makarova KS, et al. An updated evolutionary classification of CRISPR-Cas systems. Nat Rev Microbiol, Londres, 2015; (13):722-736.
- Hatoum-Aslan A, Marraffini LA. Impact of CRISPR immunity on the emergence and virulence of bacterial pathogens. Curr Opin Microbiol, Filadélfia, 2014; (17):82-90.
- Barrangou R. The roles of CRISPR-Cas systems in adaptive immunity and beyond. Curr Opin in Immunol, Filadélfia, 2015; (32):36-41.
- Barrangou R. et al. CRISPR Provides Acquired Resistance Against Viruses in Prokaryotes. Science, Washington, 2007; 315(5819):1709-1712.
- Jinek M, Chylinski K, Fonfara I, Hauer M, Doudna JA, Charpentier EA. Programmable dual-RNA-guided DNA endonuclease in adaptive bacterial immunity. Science, 2012; 337(6096):816-21.
- Hsu PD, Lander ES, Zhang F. Development and Applications of CRISPR Cas9 for Genome Engineering. Cell, 2014; 157(6):1262-78.
- Leenay RT, Beisel CL. Deciphering, Communicating, and Engineering the CRISPR PAM. J. Mol Biol, Londres, 2017; (429):177-191.
- Fuziwara CS, Kimura ET. Insights into Regulation of the miR-17-92 Cluster of miRNAs in Cancer. Front Med (Lausanne). 2015; sep. (8):2-64.
- Alcântara RL, et al. A tecnologia de CRISPR-Cas9 na terapia gênica do câncer de pulmão. RBMC, 2019 dez. (5) n.13.
- Jansen R, et al. Identification of genes that are associated with DNA repeats in prokaryotes. Mol. Microbiol, Oxford, 2002, (43):1565-1575.
- Gleditzsch D, et al. PAM identification by CRISPR-Cas effector complexes: diversified mechanisms and structures. RNA Biol, Oxford, 2019; 16(4):504-517.
- Doudna JA, Charpentier E. The new frontier of genome engineering with CRISPR-Cas9. SCIENCE, 2014; Nov. (346):6213.
- Nicholson SA, Pepper MS. CRISPR-Cas: Revolutionising genome engineering. South African Medical Research, Cape Town, 2016; set abr. (9):106.
- Lessa MJ. CRISPR-Cas9. Divulgação Científica: para entender melhor o mundo. Creditação da extensão no Instituto de Microbiologia, UFRJ, 2021. Disponível em: <https://www.microbiologia.ufrj.br/portal/index.php/pt/graduacao/informe-da-graduacao/995-crispr-cas9> Acesso em 16/01/2022.
- Arend MC, Pereira JO, Markoski MM. O Sistema CRISPR/Cas9 e a possibilidade de edição genômica para a cardiologia. Arquivo Brasileiro de Cardiologia, São Paulo, 2017; 108(1):81-83.
- Machado HC. Análise in silico de sequências de DNA de regiões genômicas associadas ao sistema CRISPR. [Dissertação de Mestrado] UFPR, 2019. 80p.
- Biswas A, et al. CRISPR Target – Bioinformatic prediction and analysis of crRNA targets. RNA Biol, Oxford, 2013; 10(5):817827.
- Sander JD, Joung KK. CRISPR Cas9 systems for editing, regulating and targeting genomes. Nature Biotechonology, 2014; 32(4):347-55.
- Deveau H, Garneau JE, Moineau S. CRISPR/Cas system and its role in phage-bacteria interactions. Annu Rev Microbiol. 2010 (64):475-493.
- Westra ER, Swarts DC, Staals RH, Jore MM, Brouns SJ, Van Der Oost J. The CRISPRs, they are a-changin´s: how prokaryotes generate adaptative immunity. Annu Rev Genet, 2012; (46):311-339.
- Barrangou R. CRISPR–Cas systems and RNA-guided interference. Wiley Interdiscip Rev RNA. 2013; (4):267-278.
- Jackson SA, et al CRISPR-Cas: Adapting to change. Science, Washington, 2017; (356):6333.
- Fineran PC, Ron LD. Gene regulation by engineered CRISPR-Cas systems. Current Opinion in Microbiology, 2014; (18):83-89.
- Hsu PD, Lander ES, Zhang F. Development and Applications of CRISPR-Cas9 for Genome Engineering. Cell, 2014; 157(6):1262-78.
- Mendelics A. CRISPR/CAS9: Edição do DNA e o tratamento de doenças. Nov, 2021. Disponível em: <https://blog.mendelics.com.br/crispr-cas9-edicao-do-dna-e-o-tratamento-de-doencas/> Acesso em 16/01/2022.
- Reis EVB, Oliveira BT. CRISPR-CAS9, Biossegurança e bioética: uma análise jusfilosófica-ambiental da engenharia genética. Veredas do direito, 2019; jan/abr.16(34):123-152.
- Puñales MK, et al. Carcinoma medular de tireoide: aspectos moleculares, clínico-oncológicos e terapêuticos. Arq Bras Endocrinol Metab, 2004; fev.(1):48.
- Siegel R, Naishadham D, Jemal A. Cancer statistics, 2013. CA Cancer J Clin.; 2013; 63(1):11- 30.
- Inca, Instituto Nacional de Câncer. MS. Disponível em <https://www.inca.gov.br/tipos-de-cancer/cancer-de-tireoide> Acesso em 15/01/2022.
- Takakura S, Mitsutake N, Nakashima M, Namba H, Saenko VA, Rogounovitch TI, Nakazawa Y, HayashI T, Ohtsuru A, Yamashita S. Oncogenic role of miR-17-92 cluster in anaplastic thyroid cancer cells. Cancer Sci; 2008; 99(6):147-154.
- Sganzerla A, Pessini L. Edição de humanos por meio da técnica do Crispr cas9: entusiasmo científico e inquietações éticas. Saúde debate; 2020. Abr-Jun. 44(125):527-540.
- Karimi Z, et al. Bacterial CRISPR Regions: General Features and their Potential for Epidemiological Molecular Typing Studies. Open Microbiol. J., Hilversum, 2018; (12):59-70.
Correspondência
Kely Braga Imamura
E-mail: [email protected]