Capacitação dos profissionais de saúde e seu impacto no rastreamento de lesões precursoras do câncer de colo uterino

Training of health professionals and its impact on the trace of precursoring injuries of the uterine column cancer

 

Juliana Jakobczynski1
Mônica Frighetto2
Marcelo Perazzoli3
Bibiana Paula Dambrós4
Bárbara Dallazem1
Alexandre Kirschnick5

 

  1. Acadêmica do Curso de farmácia, Universidade do Oeste de Santa Catarina – UNOESC – Videira-SC, Brasil.
  2. Mestre em Farmacologia, Professora do curso de farmácia, Universidade do Oeste de Santa Catarina – UNOESC – Videira-SC, Brasil.
  3. Especialista em Citopatologia Oncótica pela UNIVALI, Especialista em Citologia Clínica pela Sociedade Brasileira de Citologia Clinica- SBCC,  Farmacêutico pela Universidade do Oeste de Santa Catarina – UNOESC – Videira-SC, Brasil.
  4. Mestre em Biotecnologia, Professora do curso de farmácia, Universidade do Oeste de Santa Catarina – UNOESC – Videira-SC, Brasil.
  5. Graduado em Medicina pela Universidade Católica de Pelotas com especialidade em Anatomia Patológica pelo Grupo Hospital Conceição (GHC) em Porto Alegre.

Instituição: Universidade do Oeste de Santa Catarina – UNOESC – Videira-SC, Brasil.

Artigo recebido em 23/10/2017
Artigo aprovado em 06/02/2018
DOI: 10.21877/2448-3877.201800627

 

Resumo

Objetivo: Avaliar o impacto da capacitação dos profissionais do SUS envolvidos na coleta de amostras cervicovaginais para rastreamento de lesões precursoras do câncer de colo uterino no município de Videira (SC). Métodos: Estudo de intervenção cujas variáveis estudadas foram: adequabilidade da amostra, epitélios representados e resultado do exame citopatológico. A avaliação da qualificação dos profissionais baseou-se na comparação dos formulários referentes ao período de dezembro de 2015 a junho de 2016, antes da capacitação, com os formulários de junho de 2016 a janeiro de 2017, após a capacitação. Avaliou-se o resultado utilizando-se o teste do c2 de Pearson, com nível de significância de 5%. Resultados: Após a capacitação, houve aumento de amostras satisfatórias, de 97,81% para 99,0%. Observou-se insatisfatoriedade nas amostras coletadas antes e após a capacitação, correspondendo a 2,18% e 1,0%, respectivamente (p<0,0001). Houve índice maior de espécimes com representatividade somente de células escamosas antes da qualificação – 44,6 %. Verificou-se aumento da frequência de representação de células endocervicais, 55,39% para 85,03% (p<0,0001). Quanto aos resultados negativos para lesão intraepitelial e/ou malignidade, os percentuais obtidos foram 97,02% e 93,38%, antes e depois da capacitação, respectivamente. Foram constatados 2,41% e 5,14% (p<0,0001) de lesões menos graves, em comparação às lesões mais graves, correspondendo a 0,55% e 1,46% (p=0,0182), nas amostras obtidas antes e após a qualificação, respectivamente. Conclusão: Após a capacitação, houve melhora na adequabilidade da amostra, representação dos epitélios e resultado do exame. Logo, é imprescindível a capacitação dos profissionais coletores do exame citopatológico, proporcionando maior confiabilidade nos resultados.

Palavras-chave

Colo do útero; Capacitação profissional; Neoplasias; Sistema Único de Saúde

 

INTRODUÇÃO

O exame citopatológico foi desenvolvido pelo Dr. George Papanicolaou. Após vários estudos, esse teste passou a ser utilizado, ainda na década de 1940, como uma ferramenta valiosa para o diagnóstico precoce do câncer de colo do útero (CCU), por se tratar de um procedimento com alta precisão, custo reduzido e simples execução.(1)

No Brasil, o câncer do colo do útero corresponde à terceira neoplasia de maior incidência entre as mulheres.(2) É possível detectar lesões precursoras em mulheres assin­tomáticas através do exame citopatológico do colo uterino, podendo assim diminuir a incidência e mortalidade do câncer de colo uterino (CCU). O Ministério da Saúde do Brasil(3) vem desenvolvendo estratégias com o objetivo de reduzir a incidência de CCU e, consequentemente, a mortalidade, por meio de programas de triagem organizados, ativos e bem geridos.

Foram estimados para o ano de 2016, 16.340 novos casos de CCU e uma taxa de incidência de 15,85/100 mil mulheres.(2) De acordo com Agnolo e colaboradores,(4) na região sul do país, a estaneoplasia ocupa o segundo lugar em incidência (21/100 mil) e, em torno de 20 mil brasileiras recebem o diagnóstico dessa doença anualmente, sendo que desse montante, 5 mil morrem em virtude dela. Segundo Amaral,(5) a falta de um programa de rastreamento efetivo e a exposição das mulheres aos fatores de risco é que levam à alta incidência de tal neoplasia.

Contudo, para a eficiência no rastreamento do CCU é essencial que a fase pré-analítica seja desenvolvida corretamente, ou seja, que as amostras coletadas para o exame citopatológico apresentem qualidade, evitando desta forma, os resultados falso-negativos.(6) Uma amostra de qualidade apresenta células devidamente distribuídas, fixadas e coradas. Em contrapartida, espécimes insatisfatórios são derivados da presença de sangue, contaminantes externos, piócitos, intensa superposição celular ou dessecamento e material acelular ou hipocelular, prejudicando, dessa forma, a leitura microscópica.(7)

Para se ter uma amostra de qualidade, é necessário que o profissional coletor tenha capacidade e conhecimento para saber identificar as regiões anatômicas corretas para a coleta, as características da amostra e suas particularidades.(8) Sendo assim, associam-se a erros de coleta tanto a satisfatoriedade da amostra quanto a não representa­tividade dos epitélios. Apesar de parecer fácil, a prática do exame não é um procedimento simples, necessitando que o profissional responsável saiba localizar com exatidão o colo uterino e, sobretudo, a junção escamo-colunar (JEC). Logo, é uma técnica que possui complexidades, para a qual o profissional que coleta precisa perceber alterações fisiológicas, anatômicas e patológicas, caso haja, para realizar a coleta do material adequadamente. Para isso, é essencial uma formação continuada dos profissionais de saúde que atuam na prevenção do câncer do colo uterino.(9)

No entanto, pouco se profere sobre a qualificação dos coletadores, visto que os processos de capacitação dos profissionais envolvidos assumem caráter essencial em razão do conhecimento e da capacidade de saberem identificar as particularidades de cada amostra para uma adequada coleta com o intuito de fornecer um resultado confiável à paciente.(8) Souza e colaboradores(10) salientaram que esse profissional deve estar certo de que está preparado para fazer a execução do exame e de que possui o material necessário para isso.

A garantia da presença de amostra cervicovaginal em quantidades suficientes é fundamental para o sucesso da ação. Segundo as diretrizes do Instituto Nacional de Câncer (INCA) e diretrizes internacionais,(11) índices de resultados positivos e detecção de lesão de alto grau, inferiores ao esperado, são indicativos de resultados falso-negativos, constatando o quão importante é a especialização permanente dos profissionais que atuam na realização do Teste de Papanicolaou (PAP-TEST). Para Etlinger e colaboradores,(12) isso é uma ferramenta fundamental na atualização dos profissionais envolvidos, buscando padronizar os critérios citomorfológicos, melhorando a qualidade dos exames realizados e diminuindo a porcentagem de resultados falso-positivos e falso-negativos.

Desta forma, este estudo objetiva analisar a qualidade dos exames citopatológicos, oriundos de amostras biológicas coletadas no Sistema Único de Saúde (SUS), antes e após a capacitação dos nove enfermeiros que efetuam a coleta do exame preventivo nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) do município de Videira – SC.

Material e métodos

Esta investigação é um estudo quantitativo de intervenção, retrospectivo e documental. A casuística foi constituída a partir das informações contidas nos formulários de requisição de exame citopatológico do colo uterino, contendo as análises das amostras biológicas coletadas de pacientes de idades variadas, submetidas a coletas para o teste do Papanicolaou, atendidas em nove UBS do SUS do município de Videira-SC, utilizados pelo Instituto de Patologia (IPA) e padronizados pelo Ministério da Saúde (MS).

Primeiramente efetuou-se a capacitação profissional, no dia15 de junho de 2016, de nove enfermeiros que efetuam a coleta nas UBS do município de Videira-SC. A meto­dologia utilizada na capacitação foi fundamentada nas atividades teóricas. A capacitação foi oferecida pelos profissionais do Instituto de Patologia do Meio Oeste Catarinense (IPA), juntamente com os profissionais da Secretaria Municipal de Saúde da cidade de Videira-SC.

O conteúdo da capacitação foi definido tendo como base as atribuições dos enfermeiros na coleta e as recomendações do Ministério da Saúde (MS) para o rastrea­mento do câncer do colo do útero. Foram abordados os seguintes temas: Funcionamento do Programa Nacional de Prevenção do Câncer do Colo do Útero no Brasil; relevância do Sistema de Informação do Câncer do Colo do Útero (SISCOLO) e do preenchimento adequado do formulário de requisição do exame citopatológico, bem como da coleta adequada do exame, a faixa etária e a periodicidade recomendadas, a conduta clínica e o acompanhamento das mulheres com resultado do exame alterado.

Posteriormente foram avaliados 1.100 formulários referentes ao período de 01 de dezembro de 2015 a 14 de junho de 2016, antes da capacitação, e 1.100 formulários de 22 de junho de 2016 a 31 de janeiro de 2017, após a qualificação, totalizando 2.200 exames. Os formulários de requisição referentes ao período de 15 a 21 de junho de 2016 foram excluídos da análise.

As variáveis empregadas na análise dos formulários foram a adequabilidade da amostra, epitélios representados na amostra e resultado do exame citopatológico. Foram excluídos da pesquisa os formulários que verificavam a retirada do colo cirurgicamente (histerectomia total) ou em que o mesmo não foi visualizado. Em relação à adequa­bilidade, uma amostra pode ser classificada como insatis­fatória quando o material acelular ou hipocelular representa menos de 10% do esfregaço; presença de sangue, piócitos, contaminantes externos, intensa superposição celular, estar presente em mais de 75% do esfregaço e outros, sendo estas classificadas como insatisfatórias para avaliação da colpocitologia oncótica.(4) Já para as amostras satisfatórias é importante estarem presentes os epitélios representativos, uma vez que o conhecimento da anatomia básica do colo do útero pelo coletador é imprescindível para se obter uma coleta de material adequado.(13)

A variável “epitélios representados na amostra” foi agrupada de forma a contemplar a representatividade da JEC em que, a presença de células endocervicais e/ou metaplásicas é, no mínimo, de dez células, bem preservadas, isoladas ou em agrupamento.(14) A variável “resultado do exame” foi classificada em negativo para lesão intra­epitelial e/ou malignidade, lesão menos grave (ASC-US / LSIL) e lesão mais grave (ASC-H / AGC / HSIL / AIS / CA), conforme o procedimento preconizado pelo Ministério da Saúde para o acompanhamento e terapêutica de cada caso.(11)

Para análise dos dados usou-se o teste qui-quadrado (c2) com grau de significância adotado de 5%, sendo o valor de p<0,05 para todos os espécimes, utilizando-se o programa estatístico GraphPadPrism®.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade do Oeste de Santa Catarina (UNOESC), sob CAAE 69706913.3.0000.5367 e parecer de aprovação número 2.148.857.

 

Resultados

Após a análise dos dados obtidos, verificaram-se 2,18% (24/1.100) de insatisfatoriedade nas amostras biológicas coletadas antes da capacitação. Destas amostras, 95,83% (23/24) apresentaram artefatos de dessecamento. Após a capacitação, verificou-se 1% (11/1100) de amostras insatisfatórias, sendo que em 90,90% (10/11) o resultado foi devido à presença de artefatos de dessecamento (Tabela 1).

Em relação aos epitélios representativos, nas amostras biológicas coletadas antes da capacitação profissional, o índice de representatividade somente do epitélio escamoso foi de 44,6% e, após a qualificação profissional, a representatividade do epitélio escamoso foi de 14,96% (Tabela 2). Ou seja, houve uma melhor representação da JEC passando de 55,39% para 85,03%.

Em relação aos resultados citopatológicos das lesões intraepitelial e/ou malignidade, na Tabela 3, pôde-se observar que 97,02% das amostras coletadas antes da capa­citação foram negativas, e após a capacitação o percentual de amostras negativas foi de 93,38%. Também foi identificado que a análise das amostras biológicas com lesões mais graves (ASC-H / AGC / HSIL / AIS / CA), antes da capacitação foi de 0,55%, enquanto nas amostras biológicas coletadas posteriormente, a análise foi de 1,46%.

Material hipocelular ou acelular em menos de 10% do esfregaço; piócitos, artefatos de dessecamento, sangue, contaminantes, intensa superposição celular em mais de 75% do esfregaço foram considerados espécimes insatisfatórios para ponderação da colpocitologia oncótica.

001 - Tabela - 1

002 - Tabela - 2

003 - Tabela - 3

Discussão

Os dados apresentados neste estudo sugerem que, após a capacitação, ocorreu um aumento da satisfa­to­riedade das amostras, além de aumentos significativos na representatividade da JEC. Essa elevação no índice pode ter favorecido a redução na porcentagem de amostras negativas e o aumento das amostras positivas. Esses dados são preocupantes, visto que as coletas mal feitas podem induzir a falsos resultados negativos, o que impacta prejuízos à saúde feminina.

Foi possível verificar que as amostras insatisfatórias apresentaram diferença significativa após a capacitação, passando de 2,18% para 1,0% (p<0.0001). Segundo o Instituto Nacional do Câncer, em 2005,(15) apenas seis estados brasileiros e o Distrito Federal apresentaram taxas de exames insatisfatórios menores que 5%, que é o padrão mínimo de qualidade estabelecido pela Organização Pan-Americana de Saúde.

A insatisfatoriedade nas amostras coletadas antes da capacitação caracterizaram-se pela presença de artefatos de dessecamento de 95,83% (23/24), e devido à intensa superposição celular, 4,16% (1/24). Após a capacitação, os índices de 90,90% (10/11) deram-se, também, devido à presença de artefatos de dessecamento, e 9,09% (1/11), devido à presença de piócitos. Esses resultados estão de acordo com Amaral e colaboradores,(16) que afirmam que as principais causas de insatisfa­toriedade em amostras cervicovaginais são de celularidade escassa, fatores de obscurecimento como dessecamento e piócitos. Dias et al.(17) também relataram que os principais fatores prejudiciais à análise dos exames preventivos (1,0% de amostras insatisfatórias) foram desseca­mento, material escasso e presença de sangue, sendo consequência de uma má fixação da lâmina e problemas na coleta. Esse fato também foi constatado por Ughini e Calil,(18) que declararam que 4% dos espécimes foram considerados insatisfatórios em estudo feito nas amostras da UBS de Jari-RS. Esses resultados corroboram o que foi descrito por Bárbara e demais autores,(19) que encontraram em seu estudo diferença significativa na adequação em exames citopatológicos efetuados no serviço público e em clínicas privadas.

Amostras insatisfatórias foram encontradas apenas no SUS, a maioria apresentando piócitos e artefatos de desse­camento.

A insatisfatoriedade evidencia falha no rastreamento de lesões precursoras do câncer de colo do útero, além de causar desconforto na paciente e o desperdício de recursos destinados ao exame, uma vez que a adequação da amostra é considerada o componente mais relevante para a garantia da qualidade.(20) No entanto, a presença de piócitos (9,09%) encontrados pode ser reparada mediante higieni­zação prévia do colo uterino conforme descrevem Koss e Gompel.(21) Já a insatisfatoriedade proveniente do desseca­mento (95,83%) antes da capacitação e (90,90%) após a mesma, apresentou diminuição significativa. No procedimento de coleta do material são utilizadas a espátula de Ayre e a escovinha, sendo essencial a orientação aos profissionais sobre uma boa fixação imediata do material na lâmina, gerando resultados positivos por evitar o desse­camento.(9,22)

Foi verificada uma diminuição da representação somente das células epiteliais escamosas após a capacitação de 44,6 % para 14,9%. Essa diferença significativa dos resultados pode ser em decorrência de um melhor entendimento dos profissionais sobre a relevância de se realizar uma coleta adequada com representação da JEC.

A ausência da representatividade da JEC (44,6%) antes da capacitação também foi encontrada em estudo desenvolvido por Amaral e colaboradores.(16) Esses autores constataram ausência da representatividade da JEC em 40,37% dos espécimes, sendo um fator limitante para a análise. Ughinie e Calil(18) afirmaram que a ausência das células metaplásicas e/ou endocervicais foi o fator restrin­gente e mais regularmente encontrado nos esfregaços citopatológicos cervicais (57%) do total das amostras obtidas nas Unidades Básicas de Saúde dos municípios gaúchos pesquisados. Santos e outros(7) encontraram 20,15% de amostras avaliadas apresentando somente o epitélio escamoso; por isso, afirmaram que esse resultado pode expor a paciente a um diagnóstico falso-negativo. Segundo o Ministério da Saúde,(23) uma coleta adequada e em quantidades suficientes de material é essencial para o êxito do diagnóstico citopatológico e sucesso da ação.

Todavia, discute-se sobre a importância de uma coleta bem executada, sendo importante observar que a capacitação dos profissionais envolvidos na colheita do material cervicovaginal assume caráter primordial diante dos prós e contras desse procedimento. Ázara e demais autores,(3) em estudo realizado, asseguram que a educação permanente feita com os profissionais de saúde que executam os exames citopatológicos dos laboratórios monitorados pode ter contribuído para melhores indicadores de monito­ramento interno de qualidade, consequentemente, possibilitou uniformizar os critérios citomorfológicos e diminuir os resultados falso-negativos.

Apesar da rede pública não exigir a representação dos dois epitélios como critério para um exame apropriado, deve-se ressaltar que amostras satisfatórias podem não apresentar células da JEC.(7) Segundo as diretrizes do INCA e as diretrizes internacionais,(24) a presença de células representativas da JEC é um indicador da qualidade do exame, justificando-se que nelas se originam a quase totalidade das lesões precursoras do câncer de colo uterino. Dallazen e colaboradores(19) analisaram 470 exames preventivos de mulheres atendidas nas UBS do SUS, e 470 exames em instituições privadas, no ano de 2016, na cidade de Videira-SC, e encontraram no Sistema Único de Saúde amostras com maior porcentagem de células escamosas (43,9%). As células da JEC foram encontradas em 82,1% das amostras coletadas nas clínicas privadas, mostrando a necessidade de orientação e treinamento de profissionais que realizam esse exame preventivo para obter-se maior confiabilidade nos resultados.

Houve ainda, diferença expressiva para o resultado do exame citopatológico, sendo consequência da redução das amostras insatisfatórias e melhor representação dos epité­lios nas amostras coletadas. Os resultados negativos para lesão intraepitelial e/ou malignidade (Tabela 3), entre os exames coletados, apresentaram valores de 97,02% e 93,38%, antes e após a capacitação, respectivamente. Amaral e outros autores(16) verificaram uma ligação relevante entre resultados citopatológicos com alterações e a presença de células endocervicais (p=0,006).

Convindo com o estudo de Mintzer e outros,(25) reiterou-se que a representatividade das células metaplásicas ou endocervicais está associada com maior contingência em encontrar alterações celulares, lesões e atipias. Outro estudo realizado por Santos seus colaboradores(26) apresentou, em 134 resultados analisados, 107 com representação dos dois epitélios (escamoso e glandular e/ou metaplásico), sendo que em 27 estavam presentes apenas o epitélio escamoso, podendo levar a diagnóstico falso-negativo, o que mais uma vez ressalta a importância da conduta profissional perante os resultados encontrados, cabendo a reflexão sobre a importância de seu papel na prevenção e controle do câncer cérvico-uterino.

Damacena e seus colaboradores,(27) em pesquisa realizada em Teresina-PI, entre 2006 e 2013, constataram que 601.979 exames (99,6%) foram classificados como satisfa­tórios, enquanto que 59,6% apresentavam epitélio representativo da JEC. Porém, observaram redução constante nesse percentual, de 71,5% (2007) para 47,8% (2013).

Quantidade significativa de lesões menos graves (ASC-US / LSIL) foram detectadas após a capacitação, passando de 2,41% para 5,14%. Em relação às lesões mais graves (ASC-H / AGC / HSIL / AIS / CA), nos dados obtidos antes da capacitação, a porcentagem foi de 0,55%, enquanto que, após a capacitação, aumentou para 1,46%. Uma correta identificação dessas lesões precursoras e consequente confirmação diagnóstica, a terapia e o acompanhamento adequado podem prevenir o progresso para câncer invasivo.(28)

Em estudo de Ughini e Calil(18) não houve a identificação de lesões com malignidade em 100% das amostras das Unidades Básicas de Saúde. Ázara e outros(3) evidenciaram que a maioria dos laboratórios monitorados pelo LabMEQ-FF-UFG apresentou o indicador HSIL/satisfatórios dentro do parâmetro recomendado. Notou-se que, em média, 90% dos laboratórios que não foram monitorados apontaram o indicador de HSIL/satisfatórios inferior 0,4%. Isso pode ser explicado por estudo de Amaral e outros,(16) o qual averiguou que as frequências de lesões mais graves foram três a quatro vezes maiores quando a adequabilidade do espécime foi satisfatória para análise comparada aos esfregaços, com adequabilidade da amostra apresentando algum fator limitante, pactuando o quão importante é a capacitação dos profissionais que atuam na coleta das amostras biológicas, garantindo que elas se mantenham dispostas e bem conservadas.

Diante disso, vale ressaltar a importância desse exame ser feito por profissionais competentes, sendo a capacitação dos mesmos, um investimento que exige poucos recursos de baixo custo.

A formação continuada configura-se, para esse contexto, em uma ação simples que faz toda a diferença na qualidade e confiança dos resultados, além de oportunizar novas interpretações e enfoques, podendo modificar a realidade pesquisada. Daí a necessidade imprescindível que haja capacitação permanente dos profissionais de saúde que atuam na prevenção do câncer cérvico-uterino.

 

 

 

Conclusão

Diante dos resultados obtidos, percebeu-se que, após a capacitação dos profissionais envolvidos na realização do exame citopatológico, houve melhora expressiva na adequabilidade da amostra, representação dos epitélios e resultado do exame. Por meio desse exame, podem-se obter resultados sensíveis e específicos para rastreio das lesões precursoras do câncer de colo uterino, sendo a qualificação dos coletadores uma ferramenta de grande importância para se comprovar esses resultados.

Com desígnio de aumentar o número de espécimes adequados para análise, ficou notório o quanto é relevante qualificar constantemente os profissionais da atenção básica à saúde quanto às normas e condutas adotadas com relação à realização do exame citopatológico para o rastrea­mento do câncer de colo uterino, possibilitando amostras de melhor qualidade, uma maior confiabilidade nos resultados e mais segurança à mulher que se submete a esse exame preventivo, fornecendo diagnóstico precoce e diminuição dos altos índices de mortalidade oriundos dessa doença.

Abstract

Objective: To evaluate the impact of the training of SUS professionals involved in the collection of cervicovaginal samples for the tracing of precursor lesions of cervical cancer in Videira (SC). Methods: Intervention study whose variables studied were: sample adequacy, represented epithelia and outcom.The evaluation of the qualification of the professionals was based on the comparison of the forms referring to the period from December 2015 to June 2016, before the training, with the forms from June 2016 to January 2017, after the training.The result was evaluated using the Pearson c2 test, with a significance level of 5%. Results: After the training, there was an increase of satisfactory samples, from 97.81% to 99.0%. Unsatisfactory results were observed in the samples collected before and after training, corresponding to 2.18% and 1.0%, respectively (p<0.0001).There was a greater index of specimens with only squamous cell representation before the qualification, 44.6%.There was an increase in the frequency of endocervical cell representation, 55.39% to 85.03% (p<0.0001). Regarding the negative results for intraepithelial lesion and / or malignancy, the percentages obtained were 97.02% and 93.38%, before and after the training, respectively.It was observed 2.41% and 5.14% (p <0.0001) of less severe lesions, compared to the most severe lesions corresponding to 0.55% and 1.46% (p = 0.0182), in the samples obtained before and after the qualification. Conclusion: After the training, there was improvement in the adequacy of the sample, representation of the epithelia and result of the examination.Therefore, it is essential the training of the collecting professionals of the cytopathological exam, providing greater reliability in the results.

Keywords

Cervix uteri; Professional qualification; Neoplasia; Unified Health System

 

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Correspondência

Mônica Frighetto
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