Avaliação do status oxidativo, consumo alimentar de zinco e zinco plasmático em indivíduos infectados pelo HIV
Evaluation of oxidative status, food consumption of zinc and plasma zinc in HIV-infected individuals
Deisi Tonel1
Thiago Okagawa Silva1
Angela Khetly Lazarotto1
Diane Aparecida Muller1
Leidiane de Lucca2
Thiago Tsunehiko Dias Ichikawa3
Josana Dranka4
Paulo Rogério Pinto Rodrigues5
Thissiane de Lima Gonçalves6
Jucieli Weber7
André Lazarin Gallina7
Dalila Moter Benvegnú8
1Acadêmica(o) do curso de nutrição da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS), Campus Realeza – Realeza – PR, Brasil.
2Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Ciências Farmacêuticas da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) – Santa Maria – RS,
Brasil.
3Acadêmico do curso de química da Universidade Estadual do Centro-Oeste (Unicentro) – Guarapuava – PR, Brasil.
4Coordenadora do Centro Especializado de Doenças Infecto Parasitárias (CEDIP) – Cascavel – PR, Brasil.
5Docente do Departamento de Química da Universidade Estadual do Centro-Oeste (Unicentro) – Guarapuava – PR, Brasil.
6Docente do Departamento de Análises Clínicas do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) – Santa Maria –
RS, Brasil.
7Docente da Universidade Federal da Fronteira Sul, (UFFS), Campus Realeza – Realeza – PR, Brasil.
8Doutora/Universidade Federal da Fronteira Sul – Campus Realeza – (Docente).
Instituição: Universidade Federal da Fronteira Sul – UFFS – Campus Realeza – Realeza – PR, Brasil.
Recebido em 27/02/2018
Artigo aprovado em 23/08/2018
DOI: 10.21877/2448-3877.201800679
Resumo
Objetivo: Objetivou-se analisar o consumo alimentar e os níveis plasmáticos de zinco além de biomarcadores do status oxidativo de pacientes com infecção pelo HIV. Métodos: Foram selecionados indivíduos adultos com HIV e contagem de linfócitos T CD4<500 células/mm3, assistidos por um centro especializado, localizado na região oeste do Paraná. Realizou-se a aplicação de questionários, avaliação antropométrica e coleta sanguínea para análise de zinco e biomarcadores do status oxidativo. Resultados: Avaliou-se um total de quarenta indivíduos adultos, nos quais se observaram consumo adequado de zinco e grande frequência de eutrofia e sobrepeso. Obteve-se correlação positiva entre tióis proteicos (SH-P) e os níveis plasmáticos de zinco e correlação negativa entre SH-P e a peroxidação lipídica (PL) no plasma e nos eritrócitos. Além disso, verificou-se um aumento nos níveis de SH-P em pacientes com presença de doença oportunista em alguma fase da infecção viral. Conclusão: Apesar de não ter sido observada relação entre níveis de zinco sanguíneo e a contagem de linfócitos T CD4 e carga viral, as propriedades do mineral ainda são defendidas como essenciais.
Palavras-chave
Sorodiagnóstico; AIDS; Zinco; Estresse oxidativo; Estado nutricional
INTRODUÇÃO
Conforme dados do Ministério da Saúde, desde 1980, até junho de 2015 foram computados 798.366 casos de pessoas infectadas pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV) no Brasil. Isso expressa uma importante causa de morbidade e mortalidade, sendo que, desde o início da epidemia da síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS) até dezembro de 2014, foram identificados 290.929 óbitos tendo como causa básica a AIDS.(1)
A infecção pelo HIV envolve vários órgãos e tem como alvo o sistema imunológico, mecanismo através do qual o vírus do HIV atua introduzindo seu material genético no DNA das células do hospedeiro, principalmente nos linfócitos T CD4, destruindo-os devido à grande replicação viral. Essa morte de células vai acarretar a imunodeficiência, propiciando aos indivíduos infectados maiores chances de infecções oportunistas.(2) Após introdução da terapia antirretroviral (TARV), houve redução da morbidade e mortalidade de indivíduos que possuem infecção pelo HIV, fato este que diminui a progressão da doença por meio do controle da multiplicação viral, além de aumentar o intervalo de tempo de surgimento da doença da AIDS.(3)
Complicações desencadeadas pelo uso da TARV são comumente observadas, podendo ser citadas as interações medicamentosas, que podem levar a deficiências de micronutrientes e também a lipodistrofia. Tais alterações acompanham modificações do metabolismo de lipídios e glicídios, fazendo com que o paciente apresente risco de desenvolver doenças cardiovasculares.(4)
Desse modo, vários fatores são importantes para o cuidado do paciente com HIV e, dentre eles, a alimentação exerce papel fundamental na saúde, contribuindo para a melhora na qualidade de vida e na resposta ao tratamento. Assim, a nutrição apresenta influência sobre a imunodeficiência e morbidade decorrentes de infecções, sendo que números reduzidos de linfócitos no sistema imune parece ser uma causa significativa da perda da capacidade de defesa do hospedeiro, fato comumente observado em situações em que há deficiência nutricional do mineral zinco.(5)
O zinco é reconhecido por possuir ação em diversos sistemas do organismo humano, portanto, sua deficiência causa efeitos indesejáveis à saúde. Dentre estes, podem-se observar prejuízos no sistema imune, alterações do paladar e apetite, diminuição da ingestão alimentar, disfunções como a diarreia, alopecia, entre outras alterações. Dessa forma, é evidente a existência da relação do zinco com a AIDS, visto que a deficiência desse mineral está presente em todos os estágios da doença tornando-se um fator para a multiplicação viral.(6)
Além disso, o zinco possui propriedades antioxidantes, porém atua de forma indireta, pois o mineral não é ativo em reações de oxirredução. Seu efeito antioxidante é explicado devido ao seu papel na regulação da síntese da metalotioneína na estrutura da enzima superóxido dismutase e na proteção de agrupamentos sulfidrila de proteínas de membranas celulares por antagonismo com metais pró-oxidantes como ferro e cobre.(7) Diante do exposto, objetivou-se analisar o consumo alimentar e os níveis plasmáticos de zinco, além de biomarcadores do status oxidativo de pacientes infectados pelo HIV.
MATERIAL E MÉTODOS
Seleção dos participantes
Entre os anos de 2015 e 2016 foi realizada uma pesquisa quantitativa, na qual foram selecionados quarenta indivíduos doentes de AIDS, de faixa etária entre 18 a 59 anos, de ambos os sexos, assistidos por um centro especializado, localizado na região oeste do estado brasileiro do Paraná, que apresentassem contagem de linfócitos T CD4 inferior a 500 células/mm3, independente da carga viral.
Foi aplicado um questionário aos pacientes, de modo individual, a fim de serem analisados dados pessoais e de estado de saúde, como características de gênero, faixa etária, condições socioeconômicas e demográficas, consumo alimentar e utilização de suplementos. Abordaram-se ainda questões como o tempo que o indivíduo possui o vírus e a manifestação dos sintomas da doença, medicamentos utilizados no tratamento e efeitos adversos, medicamentos utilizados como terapia de suporte, doenças oportunistas e sintomas em geral. Os exames necessários ao acompanhamento da carga viral, a contagem de células CD4, assim como outras informações acerca de cada paciente foram acessadas mediante análise dos prontuários de atendimento.
A investigação do consumo alimentar de zinco ocorreu pela aplicação do Questionário de Frequência Alimentar (QFA) reduzido – ELSA-Brasil.(8) Além do QFA, foi aplicado o diário alimentar de três dias, também conhecido como registro alimentar.
Para cálculo do QFA, utilizou-se o programa Microsoft Office Excel, versão 2010, e para cálculo dos diários alimentares utilizou-se o software Nutrilife, versão demonstrativa 9.5. Para análise dos dados, utilizou-se a média de ambos os questionários.
A necessidade de zinco varia de acordo com a faixa etária e sexo. Em geral, segundo as Dietary Reference Intakes (DRI), que se constitui na mais recente revisão dos valores de recomendação de nutrientes e energia adotados pelos Estados Unidos e Canadá, o consumo preconizado pela Recommended Dietary Allowances (RDA) é de cerca de 8 mg/dia para mulheres e 11 mg/dia para homens e valores para avaliação do consumo recomendados pela Estimated Average Requirements (EAR) de 6,8 mg/dia para mulheres e 9,4 mg/dia para homens. Já o Tolerable Upper Intake Level (UL), definido como o valor mais alto de ingestão diária prolongada de um nutriente que não oferece risco de efeito adverso à saúde, preconiza o valor máximo de 40 mg/dia.(9)
A avaliação antropométrica aconteceu em um espaço separado, na própria unidade de tratamento de forma individualizada. Realizou-se a coleta de medidas antropométricas de peso e estatura, com auxílio de uma balança digital e estadiômetro portátil. Para a avaliação do estado nutricional dos indivíduos, fez-se o cálculo do Índice de Massa Corporal (IMC) a partir da seguinte fórmula: peso atual (Kg)/estatura (m)², com critérios de classificação determinados pela Organização Mundial da Saúde.(10)
Técnicas e instrumentos para coleta de sangue
Realizou-se uma coleta sanguínea dos participantes a fim de serem determinados os níveis plasmáticos de zinco e biomarcadores do status oxidativo. A coleta de sangue ocorreu na unidade de tratamento dos participantes da pesquisa, em sala reservada, por uma enfermeira. Para tal procedimento foram utilizadas luvas cirúrgicas, garrote, álcool 70%, algodão, curativos, seringas de 10 mL e agulhas descartáveis. O material coletado foi disposto em tubo identificado contendo o anticoagulante EDTA, homogeneizado e depositado em uma caixa de isopor contendo gelo até imediato processamento na unidade central de saúde do município. O sangue foi inicialmente centrifugado (5 min a 4.300 rpm) a fim de se obterem o sobrenadante denominado plasma e o sedimento eritrocitário. Parte do sobrenadante foi centrifugado com igual volume de ácido tricloroacético 5%, a fim de serem precipitadas as proteínas plasmáticas para análise de vitamina C. As amostras foram mantidas em freezer a -80ºC até serem realizadas as análises descritas a seguir.
Quantificação plasmática de zinco
A determinação de zinco nas amostras de plasma previamente decompostas por via úmida foi realizada através de espectrometria de emissão óptica com plasma indutivamente acoplado (ICP OES), empregand-se um espectrômetro simultâneo Spectro Ciros CCD (Spectro Analytical Instruments, Alemanha) equipado com sistema de nebulização pneumático tipo cross-flow, câmera de nebulização de duplo passo e tocha com injetor de quartzo, com 2,5 mm de diâmetro interno. A potência do plasma foi de 1.400 W e as vazões de argônio foram de 14 L min-1 (plasma), 1 L min-1 (nebulizador) e 1 L min-1 (auxiliar). O comprimento de onda para as determinações foi de 213,856 nm.
Análise de marcadores de estresse oxidativo
Objetivou-se analisar marcadores do estresse oxidativo a fim de verificar associações entre danos oxidativos e o processo de multiplicação viral.
A peroxidação lipídica no plasma e nos eritrócitos foi avaliada por meio da determinação das substâncias reativas ao ácido tiobarbitúrico (TBARS) e medida no plasma de acordo com o método descrito por Lapenna et al.(11) A técnica de TBARS baseia-se na reação do malondialdeído, substância resultante do estresse oxidativo (EO) sobre membranas lipídicas celulares, com o ácido tiobarbitúrico, que resulta em uma coloração rósea, determinada através de método colorimétrico, em 532 nm.
Os níveis dos grupos tióis proteicos (SH-P) foram imediatamente determinados depois da reação com 5,5′-ditio-bis-(2-ácido nitrobenzoico) (DTNB) e a cor desenvolvida foi mensurada espectrofotometricamente em 412 nm, de acordo com Ellman.(12)
A determinação de vitamina C plasmática foi estimada como descrito por Galley et al.,(13) com pequenas modificações de Jacques-Silva et al.(14) O plasma foi precipitado com 1 volume de ácido tricloroacético (TCA) 5% e o sobrenadante misturado com dinitrofenilhidrazina (DNPH) e ácido sulfúrico 65%, produzindo um composto de coloração amarelada, detectado em 520 nm.
Análise estatística dos dados
Os dados foram analisados utilizando-se o software Statistica, versão 8.0, com aplicação do teste de correlação linear múltipla, assim como o teste de análise de variância (ANOVA), seguido pelo teste post-hoc de Duncan. Consideraram-se valores estatisticamente significativos quando o valor de p < 0,05.
Este projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal da Fronteira Sul – UFFS sob o número 33713113.0.0000.5564. Todos os participantes selecionados assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE).
RESULTADOS
Obteve-se um total de quarenta (n=40) indivíduos adultos entrevistados, dos quais 21 (52,5%) eram do sexo masculino e 19 (47,5%) do sexo feminino, com média de idade de 40 anos para ambos os sexos, residentes, em sua maioria (67,5%), na cidade em que se localiza o centro especializado. Analisaram-se também dados sociodemográficos, no qual 24 participantes (60%) não concluíram a educação básica, apresentando de forma expressiva o ensino fundamental incompleto ou completo ou o ensino médio incompleto. Ainda, a maioria dos indivíduos caracterizava-se como solteiro(a) (42,5%), não fumante de tabaco (75%) e não etilista (67,5%), conforme Tabela 1.
Em relação ao estado nutricional, verificou-se que a maioria das pessoas avaliadas apresentava eutrofia (40%), seguido de sobrepeso (32,5%), conforme Figura 1.
Ao serem questionados sobre a história clínica da doença, os indivíduos contraíram em sua maioria (62,5%) a infecção viral via relação sexual desprotegida e 30% do total de pessoas não possuía conhecimento sobre a origem de contração do vírus do HIV. Vinte e quatro participantes (60%) relataram conhecimento em relação à detecção do vírus através da realização de exames rotineiros, apresentando tempo médio de 72,5 meses de detecção viral, ou seja, a partir do momento da descoberta da infecção viral. Além disso, exames sanguíneos demonstraram que a contagem média de linfócitos T CD4 foi de 251,8 cél/mm³ e a determinação média da carga viral apresentou-se em 1660,9 cópias/mL, conforme informações expressas na Tabela 2.
Figura 1. Classificação do estado nutricional dos participantes da pesquisa (n=40).
Quando indagados sobre a presença de sinais e sintomas típicos da infecção pelo HIV, 47,5% responderam positivamente a esta questão, sendo mais citados os sinais e sintomas de fraqueza, vertigem, náusea, febre e perda ponderal. Referente ao questionamento da presença ou ausência de doenças oportunistas, 52,5% apresentaram o desenvolvimento de algum tipo de doença, sendo as mais citadas pneumonia, toxoplasmose, tuberculose e o desenvolvimento de infecções recorrentes (urinária, vaginal e de gengiva). Referente ao uso de medicamentos pertencentes à TARV, os mais utilizados foram o efavirenz, lamivudina, tenofovir, zidovudina e o atazanavir de forma isolada ou mais comumente observado na forma de combinações de medicamentos em um único comprimido.
Ao se analisarem questões referentes à história alimentar, verificou-se uma média de três refeições realizadas no dia. Questionados quanto à percepção em relação ao apetite, 67,5% apresentaram apetite bom, sem mudança de hábito alimentar, mas omitindo refeições em situações especiais, conforme expresso na Tabela 3.
Em relação à avaliação do consumo alimentar de zinco, pode-se notar que a média obtida através dos questionários alimentares apresentou maior número de valores acima da recomendação pela EAR para ambos os sexos. Além disso, as análises plasmáticas de zinco na população estudada mostraram grande variação, sendo valores superiores aos de referência (70 µg/dL a 115 µg/dL), podendo ser visualizado na Figura 2.No que diz respeito às análises referentes ao status oxidativo foram verificadas correlações entre os biomarcadores. Assim, houve correlação positiva entre SH-P e zinco plasmático, ou seja, quanto maior a concentração de SH-P no plasma, maior a concentração de zinco plasmático. Obteve-se também, correlação negativa entre SH-P e níveis de peroxidação lipídica (PL) evidenciados por meio de TBARS no plasma e nos eritrócitos. Esta correlação demonstra que, quanto maiores os níveis de SH-P, menor será a PL plasmática e eritrocitária.
Explorando de forma mais minuciosa as variáveis referentes ao EO, foi possível demonstrar um aumento dos níveis de SH-P em indivíduos que já desencadearam algum tipo de doença oportunista no período de tempo em que há o conhecimento da detecção do vírus do HIV (p = 0,008), conforme Figura 3.
Figura 2. Análise do consumo alimentar de zinco (A) e dos níveis plasmáticos de zinco (B) dos participantes da pesquisa (n=40).
Figura 3. Biomarcadores do status oxidativo e sua relação com a ocorrência das doenças oportunistas nos participantes da pesquisa
A: TBARS no plasma; B: TBARS nos eritrócitos; C: SH-P no plasma; D; Vitamina C no plasma.
* Diferença significativa do grupo ausência de doença oportunista (p = 0,008).
Questionados quanto ao uso de suplementos de vitamina e/ou mineral, apenas cinco participantes faziam uso, sendo eles suplementação proteica, com cálcio, ácido graxo ômega-3 e multivitamínico e mineral. Como a expressividade de pessoas que fazem uso desses suplementos foi baixa (20%), para fins de análise estatística não foram descartados valores referentes às análises de consumo e sanguíneas.
DISCUSSÃO
Por intermédio do presente estudo, analisou-se o histórico pessoal da população estudada e pode-se notar que a maioria dos indivíduos caracteriza-se como solteiro (a) (42,5%), com educação básica de forma não concluída (60%), fato encontrado também por Ferreira et al.,(15) os quais avaliaram um total de 205 pessoas com infecção pelo HIV e obtiveram dados semelhantes aoa do presente estudo, com 55,1% das pessoas que não possuíam a educação básica completa e 32,2% de indivíduos solteiros.
Considerando os dados referentes à avaliação do estado nutricional, pode-se notar que, no presente estudo, obteve-se um total de 52,5% de indivíduos que apresentavam algum grau de excesso de peso e 40% de indivíduos que apresentavam adequação do seu estado nutricional. Corroborando com esses resultados, Moutinho et al.(16) avaliaram a evolução do estado nutricional em vinte pacientes com AIDS, onde obtiveram grande expressão de indivíduos com excesso de peso, sendo caracterizado por 75% do total de indivíduos da pesquisa.
A realização da avaliação do estado nutricional de pessoas com HIV torna-se ponto chave no controle da evolução da doença e no estado de saúde do indivíduo. Com a utilização frequente da TARV, o perfil nutricional de indivíduos com essa infecção modificou-se ao longo do tempo, passando de um estado assíduo de desnutrição e deficiências nutricionais para um quadro de excesso de peso associado à maior predisposição para o surgimento de síndrome metabólica devido à infecção crônica pelo HIV.(17) Assim, torna-se cada vez menos comum o achado de magreza e desnutrição nesse público estudado.
Pesquisas relatam possíveis fatores associados ao excesso de peso em pacientes com infecção pelo HIV, sendo eles a alimentação, fatores fisiológicos, psicológicos, genéticos e condições ambientais, além do desejo de não parecer magro demais e transmitir a ideia de possuir alguma doença. Vários fatores podem estar envolvidos no ganho de peso e mudanças na distribuição de gordura corporal em usuários da TARV, na qual há evidências de que o uso de antirretrovirais esteja diretamente associado à ocorrência de lipodistrofia, porém não há evidências da relação entre o uso da terapia com excesso de peso.(18)
Referente às características clínicas dos participantes, observou-se que eles apresentavam contagem de linfócitos T CD4 < 500 cél/mm³ e, em sua maioria, com carga viral indetectável (n = 28). Achado semelhante ao presente estudo, realizado por Rezer et al.,(19) mostrou baixa contagem de linfócitos T CD4 e carga viral frequentemente indetectável de cópias do vírus/mL. Este quadro clínico sugere uma boa adesão ao tratamento e ao uso da TARV, fato este que promove a contenção da replicação viral. No entanto, sabe-se que a manutenção do estado imunológico está associada a um conjunto de fatores e que a baixa contagem de células CD4 pode ser preditiva de piora no prognóstico da doença.(20)
Doenças oportunistas em indivíduos com HIV se desenvolvem em decorrência da imunodeficiência do hospedeiro. Ou seja, quanto menor for a contagem de linfócitos T CD4, maior será a imunodeficiência do indivíduo com HIV e maior será a chance de desenvolver algum tipo de doença oportunista. No presente estudo, foi encontrada uma taxa alta de indivíduos que já possuíram algum tipo de doença oportunista (52,5%), fato este também avaliado no estudo de Silva et al.,(21) o qual obteve incidência de 29,3% de pessoas, sendo as mais citadas as hepatites C, B e A, tuberculose, toxoplasmose e sífilis, respectivamente. Relativo à história alimentar, um estudo que avaliou o perfil alimentar de indivíduos infectados pelo HIV obteve média de refeições realizadas no dia de 3 a 4, dado também encontrado no presente estudo, o qual é considerado baixo quando se orienta a realização de cinco a seis refeições diárias.(22) A partir da realização de uma refeição saudável e com a introdução de alimentos de fontes de zinco, como produtos de origem animal, cereais integrais e leguminosas, é possível ingerir boas fontes deste mineral.(23) Como foi destacado anteriormente, os participantes do estudo apresentaram um consumo adequado desse mineral, porém esta ingestão acima do recomendado não apresenta risco à saúde dos pacientes visto que nenhum deles apresentou consumo superior ao limite máximo tolerável de 40 mg de zinco de recomendação para uma ingestão segura.(24)
Com base nesse consumo, pode-se notar que houve boa absorção do zinco ingerido através da alimentação ao se observarem os valores do mineral no plasma. No entanto, esses valores mostraram-se superiores ao valor de referência, fato este que deve ser monitorado, pois, segundo Mafra e Cozzolino,(25) concentrações plasmáticas de zinco superiores a 150 g/dL são indicadores de toxicidade. Além disso, o estudo demonstrou que a TARV reduz deficiências de zinco.(26) Assim, a elevação nas concentrações plasmáticas de zinco podem ser decorrentes do alto consumo do mineral através da alimentação, estando associado ao uso da TARV.
A ocorrência da redução dos níveis de zinco plasmático facilita a multiplicação do vírus do HIV, o qual promove aumento da taxa de infecção de células imunes. Além disso, a produção de receptores celulares para o vírus do HIV é dependente da concentração de zinco, ou seja, os receptores podem ser inibidos na presença do mineral, diminuindo assim a proliferação viral. Desta forma, estudos avaliaram a relação entre a concentração de zinco no plasma e respostas imunológicas após suplementação do mineral em pacientes HIV positivos. Os resultados mostraram que a contagem de células CD4 foi maior e da carga viral menor nos pacientes que receberam a suplementação com zinco em comparação com aqueles que receberam o placebo.(27) No entanto, apesar dos indivíduos do presente estudo apresentarem altas concentrações de zinco no plasma, não se observou relação entre a concentração do mineral e a contagem de linfócitos T CD4 e a carga viral.
Além dessas funções, o zinco possui papel na proteção antioxidante das células combatendo as espécies reativas de oxigênio (EROs). Assim, quanto menor a disponibilidade de zinco no organismo humano maior será a expressão do quadro de EO, onde ocorre uma quebra do equilíbrio, favorecendo os oxidantes, frente aos antioxidantes, fato este que prejudica a defesa imunológica em relação à infecção viral.(28)
De forma geral, indivíduos que possuem a infecção pelo HIV apresentam depleção de linfócitos T CD4 através da apoptose, que, segundo Romero-Alvira e Roche,(29) esse fato ocorre não somente pela multiplicação viral, mas também devido ao EO e à diminuição da glutationa (GSH). Este é um potente agente redutor, o qual apresenta a capacidade de eliminar EROs. Ainda, pode ser visualizado que quanto maior a concentração de SH-P no plasma, medida indireta de GSH, menor é o processo de PL em decorrência ao combate das EROs. Este fato pode ser visualizado no presente estudo, uma vez que houve correlação positiva entre as concentrações de SH-P e zinco plasmático, e correlação negativa entre as concentrações de SH-P e TBARS no plasma e nos eritrócitos, fato este que comprova mais uma vez a ação dos grupos sulfidrílicos (SH) no combate às EROs e diminuição da PL.
Paralelamente, a literatura relata que a baixa concentração de GSH no metabolismo é relacionada fortemente à diminuição da sobrevivência de pessoas que possuem a infecção pelo HIV.(30) Contudo, não existem dados demonstrando maiores níveis de GSH, ou mesmo de SH-P em indivíduos que já desenvolveram algum tipo de doença oportunista durante a infecção viral. Desta forma, surgem duas hipóteses para justificar tal achado: i) a de que os indivíduos estudados não estavam apresentando a doença oportunista no momento da coleta sanguínea e ii) a de que pode ter ocorrido uma compensação no sentido de aumentar os níveis desses antioxidantes, já que anteriormente os mesmos foram depletados justamente em função de doença oportunista.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este estudo demonstra que o consumo alimentar de zinco foi superior ao determinado pela EAR, fazendo com que os indivíduos possuíssem alto processo de absorção, visto que apresentaram altas concentrações do mineral no plasma. Além disso, o presente estudo demonstrou correlação positiva entre níveis de SH-P e zinco plasmático e correlações negativas entre níveis de SH-P e TBARS no plasma e nos eritrócitos.
Apesar de o zinco sanguíneo não ter tido relação significativa sobre os linfócitos T CD4 e carga viral, suas propriedades ainda são defendidas como essenciais, uma vez que esse micronutriente possui papel comprovado tanto nos mecanismos de proteção antioxidante quanto no fortalecimento do sistema imunológico.
Verificou-se também que há necessidade de acompanhamento periódico no que diz respeito a parâmetros que avaliam o status oxidativo, visto que a diminuição de antioxidantes e o aumento da produção de radicais livres podem agravar o estado de saúde dos indivíduos. Por fim, tendo em vista a limitação do tamanho do público estudado, há necessidade de outros estudos que visem a determinação dos benefícios do zinco em pacientes infectados pelo HIV, podendo também ser realizada uma suplementação desse mineral concomitante ao estudo dos mesmos parâmetros analisados neste estudo.
Abstract
Objective: The objective was to analyze dietary intake and plasma zinc levels as well as biomarkers of the oxidative status of patients with HIV infection. Methods: Adult individuals with HIV and CD4 T lymphocyte counts <500 cells/mm³ were selected, assisted by the Specialized Center for Parasitic Infectious Diseases, located in Cascavel, Paraná were selected. Questionnaires, anthropometric evaluation and blood collection were used for the analysis of zinc and oxidative status biomarkers. Results: It was interviewed a total of forty adult individuals, who obtained adequate consumption of zinc and a high rate of eutrophy and overweight. There was a positive correlation between protein thiols (P-SH) and plasma zinc levels and negative correlation between SH-P and lipid peroxidation (LP) in plasma and erythrocytes. In addition, there was an increase in SH-P levels in patients with opportunistic disease at some stage of viral infection. Conclusion: Although no relationship was observed between blood zinc levels and CD4 T lymphocyte count and viral load, their properties are still advocated as essential.
Keywords
Serodiagnosis; AIDS; Zinc; Oxidative stress; Nutritional status
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Correspondência
Deisi Tonel
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