Abordagem ética da gestão estratégica responsável nas organizações
Ethical approach to responsible strategic management in organizations
Paulo Murillo Neufeld, PhD
Atualmente, o aprimoramento da gestão estratégica responsável das organizações tem sido bastante discutido na esfera da administração empresarial internacional. Modelos conceituais foram criados para desenvolver habilidades em gestão estratégica responsável, alguns deles, inclusive, com um forte viéis moral [modelo de processo de planejamento estratégico paralelo modificado, modelo de desenvolvimento contratual/estratégico, modelo das teorias organizacionais e suas ênfases morais relativas, modelo de desenvolvimento moral organizacional e modelo para a melhoria da gestão estratégica responsável]. O modelo das teorias organizacionais e suas ênfases morais e o modelo de desenvolvimento moral organizacional são as duas propostas que procuram atender à demanda por maior eticidade, na gestão estratégica das instituições.
Modelo das Teorias Organizacionais e Ênfases Morais
A gestão estratégica responsável das organizações envolve uma crescente conscientização, por parte dos tomadores de decisões estratégicas, dos pressupostos da teoria organizacional e suas ênfases morais relativas. As suposições que os gestores de estratégia fazem em relação à natureza da organização afetam o espectro das opções estratégicas que eles têm em consideração e o valor moral relativo que eles atribuem a cada opção.
Um modelo útil para comparar as principais teorias organizacionais e suas ênfases morais relativas é mostrado na Tabela I. Apesar de serem possíveis outras categorias de teorias organizacionais, a Tabela I cobre a maioria das configurações.
A primeira coluna, à esquerda da Tabela I, mostra as teorias organizacionais descritivas e normativas que tipificam os tratamentos [Padrões] da teoria organizacional orientada por resultados. O foco está tanto nas formas mecanicistas quanto organísmicas que, quando adaptadas com sucesso em uma organização, a faz prosperar, atingindo seus objetivos. As teorias normativas de alcance de metas implicam que as organizações subscrevam que têm em primeiro plano as metas propostas. A ênfase moral dos tomadores de decisão estratégica, que assumem essa visão organizacional por metas, tendem a enfatizar os fins morais de uma possível estratégia, onde se persegue a não violação de direitos e a não ruptura das relações, mesmo quando se deseja intensamente alcançar as metas estabelecidas.
Os teóricos contratualistas, todavia, têm defendido uma visão diferente das organizações. Essa visão é mostrada na segunda coluna da Tabela I. Esses consideram as organizações como um conjunto de relacionamentos [Contratuais] entre indivíduos e grupos e não como entidades orientadas por metas. Os teóricos de contratos descritivos e normativos organizacionais/sociais argumentam que os arranjos contratuais são bons porque os indivíduos podem contratar livremente e perseguir seus próprios interesses. Contratos sociais podem proteger os indivíduos contra danos organizacionais ou especificar as condições dentro das quais as partes interessadas podem desenvolver confiança mútua, ao ponto de gerar e manter ações coordenadas, com a mínima coerção. A ênfase moral dos teóricos contratuais está nos meios morais, ou seja, respeito aos direitos e deveres das partes contratantes. Respeitar os termos do contrato torna-se um teste de gestão estratégica responsável, apesar de suas consequências econômicas.
Na terceira coluna da Tabela I, são apresentados os teóricos organizacionais que colocam, nas organizações, o foco no valor intrínseco dos indivíduos [agency-oriented]. De fato, as organizações são vistas como “arenas” dentro das quais os caráteres individuais se desenvolvem, independentemente dos resultados econômicos ou acordos contratuais. A ênfase moral dessa orientação está baseada no apoio à integridade moral dos indivíduos e no desenvolvimento do caráter pela prática regular de recompensas às ações virtuosas e de condenações das ações amorais.
Modelo de Desenvolvimento Organizacional Moral
A condição ótima de gestão estratégica responsável encontra-se numa configuração cultural que valoriza a integridade individual e institucional, respeita os direitos e a justiça das partes interessadas, estimula o desenvolvimento moral e nutre iniciativas organizacionais que sustentam uma ação genuinamente colaborativa, flexível e oportuna.
Os clássicos trabalhos de Kohlberg [Philosophy of moral development], e Petrick e Manning [Developing an ethical for excellence] fornecem um modelo de desenvolvimento moral dos indivíduos e das organizações e identifica os climas éticos organizacionais que sustentam as condições que conduzem à gestão estratégica responsável [Tabela II].
O modelo da Tabela II varia de uma etapa individual e institucional (Etapa 1) para uma etapa mais inclusiva, com maior quantidade de princípios para o desenvolvimento moral (Etapa 6). É importante notar que as organizações que operam nas duas primeiras etapas estão atoladas numa “floresta moral”, ou seja, em padrões de comportamento que toleram manobras, enganos, traições e/ou deslealdades e não conseguem chegar, por isso, a desenvolver a produtividade colaborativa definida na etapa 6, isso é, padrões comportamentais que retribuem com justiça os colaboradores, respeitam os direitos das partes interessadas e estimulam a cooperação que leva à confiança. A gestão estratégica responsável, então, não existe nas primeiras duas etapas, porque falta, para a inclusão das partes interessadas, o intercâmbio moral digno de confiança e a consideração pelas relações humanas e o impacto ecológico.
É importante que os gestores saibam que as organizações podem se tornar fixadas num certo nível de desenvolvimento moral, experimentando um desenvolvimento moral imobilizado, com um desfecho que revela um planejamento estratégico abaixo do padrão. Sem uma liderança moral forte, as organizações podem institucionalizar a mediocridade no planejamento estratégico, na formulação de políticas e na implantação de procedimentos. O surgimento de grupos fechados, por exemplo, pode levar à formação de “guetos” que se alinham na etapa 3, tornando-se leais, principalmente, às metas departamentais, ao invés de estarem vinculados à missão organizacional, prioridades da sociedade ou preocupações ecológicas. Se esse padrão persiste e se espalha, uma organização pode ser reduzida a uma coleção de subculturas territoriais, cada uma defendendo seus próprios interesses, à custa de toda a organização. No entanto, as disputas por espaço nas organizações dissipam-se quando se estabelece uma produtividade cooperativa e se estimula o irrestrito respeito pela colaboração, direitos e justiça.
Ao usar a informação da Tabela II em formato de pesquisa/investigação, os gestores podem determinar o nível de desenvolvimento moral organizacional, num dado momento, por função/atividade ou como um todo. Uma vez que o nível de desenvolvimento moral é estabelecido, os gestores podem planejar sessões de treinamento de desenvolvimento moral customizadas, para as necessidades da organização e seus funcionários, para aperfeiçoar sua cultura moral e eficiência organizacional.
Essas etapas de desenvolvimento moral organizacional podem ser inseridas numa tabela revisada, que integra as informações das Tabelas I e II. Essa tabela é mostrada abaixo:
Como a Tabela III indica, o nível de desenvolvimento moral em culturas organizacionais nutre certos tipos de capitalismos e honra certos tipos de contratos. As etapas morais de 1 a 3 irão sustentar otimamente os contratos de agências/representação, a etapa moral 4 irá sustentar otimamente os contratos fiduciários e as etapas morais 5 e 6 irão sustentar otimamente os contratos sociais múltiplos. As etapas de desenvolvimento moral organizacional, então, podem se associar com etapas de desenvolvimento estratégico/contratual para prever direções [Tentativas] estratégicas. Esse vínculo é importante para os esforços de desenvolvimento organizacional que se propõem forjar uma cultura moral que suporte, no lugar de resistir, a gestão estratégica responsável das partes interessadas.
As seis etapas do desenvolvimento moral também coincidem sumariamente com o modelo de seis etapas de evolução pessoal e organizacional de gestão de Torbert [Pessoal: impulsivo, oportunista, diplomata, técnico/especialista, realizador e estrategista – Organizacional: concepção, investimento, incorporação, experimentos, produtividade sistemática e questionamento colaborativo], para sucesso de longo prazo. Torbert considera que a primeira etapa de evolução organizacional é a concepção do “sonho de sucesso futuro”, que é levada a cabo pelo “gestor impulsivo”. É somente na sexta etapa da evolução que surge o “gestor de estratégia”, na medida em que a organização incorpora ideias de questionamento colaborativo e ações oportunas de sucesso em longo prazo.
De fato, as culturas organizacionais, que desenvolvem as condições morais e colaborativas para a gestão responsável, preparam as instituições para a implantação total tanto do processo de planejamento estratégico quando da estrutura de desenvolvimento contratual.
Referência
Petrick JÁ & Wagley RA. Enhancing the reponsable strategic management of organizations. The Journal of Management Development. 1992;11(4): 57-72.
Paulo Murillo Neufeld, PhD
Editor-Chefe da Revista Brasileira de Análises Clínicas (RBAC)